2ª Turma do STF mantém anulação da criação da Procuradoria de Contas do DF

23/11/2022

Tendo em vista a autonomia organizacional e administrativa dos Tribunais de Contas, apenas estes órgãos podem desencadear o processo legislativo que resulte em mudança em suas estruturas. Com base na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, a 2ª Turma da corte, por 3 votos a 2, manteve nesta terça-feira (22/11) a decisão que declarou a inconstitucionalidade da criação da Procuradoria-Geral do Tribunal de Contas do Distrito Federal por emenda à Lei Orgânica do DF, de iniciativa do Legislativo.


Fachin disse que Legislativo não poderia criar Procuradoria-Geral de Contas do DF
Fellipe Sampaio/STF
Com o placar em 2 a 2, o julgamento foi suspenso em novembro do ano passado, uma vez que o STF estava com dez ministros, um integrante a menos em sua composição, desde a aposentadoria de Marco Aurélio, em 12 de julho.

A sessão foi retomada nesta terça com o voto do ministro André Mendonça, que foi empossado no Supremo em dezembro. Ele seguiu o voto do relator, Edson Fachin, para declarar a inconstitucionalidade da emenda que criou a Procuradoria-Geral do Tribunal de Contas do DF. No entanto, o ministro admitiu a possibilidade de criação de órgão que exerça funções parecidas, mas que seja estritamente auxiliar à corte, e não independente.

Voto do relator
Em decisão monocrática de novembro de 2019, o relator do caso, ministro Edson Fachin, declarou a inconstitucionalidade do artigo 84-A da Lei Orgânica do Distrito Federal. O dispositivo, incluído pela Emenda 95/2016, criou a Procuradoria-Geral do Tribunal de Contas do DF.

Fachin entendeu que a decisão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal que declarou a constitucionalidade do artigo 84-A divergiu da jurisprudência do Supremo, que diz que apenas os Tribunais de Contas podem desencadear o processo legislativo tendente a modificar suas estruturas (ADI 4.418).

"Conquanto as funções exercidas por procuradorias junto a Tribunais de Contas — como no caso ora em análise — sejam distintas daquelas desempenhadas por procuradores do Ministério Público junto ao TCU, mutatis mutandis, em ambas as situações o que se desdobra são efeitos da autonomia institucional conferida àqueles tribunais pela própria Constituição da República, circunstância que vincula a iniciativa de processo legislativo disposto a alterar a estrutura organizacional de corte de contas", argumentou Fachin na decisão monocrática.

A Procuradoria-Geral de Justiça e a Procuradoria-Geral do Distrito Federal interpuseram agravos regimentais. Fachin votou, em novembro de 2021, por negar os dois recursos. O ministro reforçou que tribunais têm reserva de iniciativa de projeto que altere seu funcionamento e que promulgação de emenda a lei orgânica ou constituição de iniciativa do Legislativo não pode contornar tal restrição.

A interpretação do relator foi seguida pelo ministro Ricardo Lewandowski. A seu ver, a inobservância da competência reservada a órgãos judiciais para propor alterações em seu funcionamento e estrutura macula o processo legislativo, acarretando inconstitucionalidade formal.

Votos divergentes
O ministro Gilmar Mendes abriu a divergência. De acordo com o magistrado, a reserva de iniciativa para assuntos do Judiciário não engloba emendas a leis orgânicas ou Constituição, apenas a leis ordinárias. Tanto que a Emenda Constitucional 45/2004 extinguiu os Tribunais de Alçada.

Além disso, Gilmar mencionou que a jurisprudência do STF reconhece a ocorrência de situações em que o Legislativo precisa praticar atos judiciais contra outros poderes para preservar sua estrutura e independência.

Dessa maneira, ele votou pela declaração de constitucionalidade do artigo 84-A da Lei Orgânica do Distrito Federal mediante a seguinte interpretação, conforme ao artigo 132 da Constituição Federal: "A atuação judicial da Procuradoria-Geral do Tribunal de Contas do Distrito Federal somente será admitida nas hipóteses em que aquela corte de contas estiver em juízo, em nome próprio, para preservar a sua autonomia e independência perante os demais poderes do Distrito Federal".

O voto de Gilmar Mendes foi seguido pelo ministro Nunes Marques. Segundo lembrou o magistrado, emendas constitucionais só não podem abolir a forma federativa de Estado; o voto direto, secreto, universal e periódico; a separação dos poderes; e os direitos e as garantias individuais, conforme o artigo 60, parágrafo 4º, da Constituição Federal.

Como o dispositivo não veda emendas que tratem do funcionamento de tribunais, a criação da Procuradoria-Geral do Tribunal de Contas do Distrito Federal não violou a Carta Magna, ressaltou Nunes Marques.

RE 1.023.883

Fonte: Revista Consultor Jurídico - Por Sérgio Rodas